sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Quando a Vontade faz a diferença na vida do cidadão: um bom exemplo


 

Na sua vida, quantas vezes você já escutou gestores público recorrerem ao argumento da falta de recursos para justificar a desassistência aos cidadãos, que por força constitucional, têm DIREITO aos serviços essenciais, de Saúde, Educação e Segurança? Na Saúde Pública nem sei se já não estamos um tanto anestesiados com as notícias cotidianas sobre nossos compatriotas mais carentes, que impossibilitados de pagar pela saúde privada, padecem e morrem nas filas intermináveis de caóticos hospitais, isso quando conseguem chegar até um deles, depois de enfrentarem a via crucis que começa na busca por atendimento básico em precários postos de saúde (quando eles existem, e têm médicos trabalhando). Esse é um retrato bastante generalizado da situação atual do SUS, um sistema cuja concepção é irrefutavelmente bela e generosa, e que conta, sim com algumas ilhas de excelência. Quando os idealizadores do nossos Sistema Único, e universal, de Saúde o inscreveram na Constituição de 1988, não imaginaram que quase trinta anos depois, o SUS ainda não estaria plenamente regulamentado. Nem supuseram, decerto, a anomalia -- realidade prática e objetiva vivida hoje  -- que impõe aos estados e municípios as responsabilidades mais pesadas e custos incompatíveis com seus orçamentos,  enquanto a União vem lavando as mãos solenemente, limitando seus gastos com Saúde a meros 4% das receitas vinculadas do Orçamento (média anual). Só para que se tenha uma noção do que isso significa, há vários municípios no Brasil que chegam a gastar 30% das receitas vinculadas dos seus Orçamentos com Saúde, quando sua obrigatoriedade de investimento é de 15%. E isso para sustentar o precário cenário que se acaba de descrever. Do mesmo modo, até que se iniciasse a crise econômica e financeira que vem deixando estados e municípios sem capacidade de fazerem frente às suas despesas mínimas de manutenção, todos os estados da Federação investiam mais que os 12% obrigatórios. Já o governo federal seguia se fazendo de morto. Se, nos últimos anos, a União tivesse investido os 10% idealizados na concepção do SUS, seriam mais de 150 bilhões de reais por ano injetados no nosso sistema de saúde. Obviamente, não é que dinheiro só resolva tudo. Pode não resolver nada, sobretudo quando falta gestão, mas é fato que Saúde custa caro, seja ela pública ou privada. Aliás, com todas as justas críticas que se possa fazer à vinculação de despesas e receitas do Orçamento público, é alvissareira a notícia de que a União estará obrigada a investir mais em Saúde Pública nos próximos anos. Pois ao contrário da Educação, em que um bom professor é infinitamente mais importante que um tablet, na Saúde, a tecnologia e os insumos podem fazer a diferença entre a vida e a morte, a dor e o alívio. Faço esse extenso preâmbulo apenas para reconhecer que quem faz gestão de Saúde Pública neste país, realmente enfenta dificuldades reais e enormes. Falta dinheiro mesmo (pelo menos no âmbito de estados e municípios). E sobram necessidades. Mas é aí que conceitos como Prioridade, Compromisso e Seriedade fazem toda a diferença.
No dia dezoito do mês de dezembro passado, a capital do Rio Grande do Norte, inaugurou seu primeiro hospital público municipal. Na pindaíba generalizada em que andam os municípios brasileiros, que não estão conseguindo nem manter os postos de saúde funcionando em condicões básicas, o que explica esse fenômeno? Que prefeito maluco é esse que abre um serviço HOSPITALAR em conjuntura econômico-financeira tão adversa? E note-se bem que não me refiro ao custo de instalação do hospital, que embora seja elevado, é evento único, e sempre se consegue alguma verba extra para ajudar. Quem faz gestão pública de Saúde sabe que o drama vem depois, é o chamado custeio, ou seja, o dinheiro que vai sair todos os meses dos cofres públicos para pagar médicos, enfermeiros, faxineiros, seguranças, remédios, insumos de toda natureza, enfim. Essa foi, aliás, a grande pegadinha dos governos petistas para estados e municípios: cofres abertos para montar estruturas (como as UPA´s) e abrir serviços, mas e depois?
Bem, voltando a Natal, some-se à atual crise financeira nacional, um cenário de terra arrasada, herdado pelo prefeito Carlos Eduardo, há três anos. Sua antecessora havia deixado a cidade à mais completa míngua, sem coleta de lixo, sem merenda nas escolas, postos de saúde fechados, no maior colapso de gestão pública que eu já pude testemunhar, nesse país onde os absurdos da vida pública desafiam a imaginação. Pois foi enfrentando todas essas adversidades que Natal  ganhou, há pouco menos de um mês, seu primeiro hospital municipal. Palmas para Carlos Eduardo Alves, que fez da Saúde uma Prioridade de gestão, não apenas no discurso, mas na prática. Se não existe mágica em gestão pública, existe, sim, a escolha. A questão não é matemática, mas política. Quando os recursos são insuficientes -- e a verdade é que, hoje, eles são efetivamente insuficientes nos cofres da grande maioria de municípios brasileiros, face a todas as despesas de custeio, somadas a quedas expressivas de receita (que começaram no primeiro governo Dilma com as políticas de isenção fiscal para estímulo ao consumo) -- o gestor tem de fazer uma escolha, com base naquilo que considera ser prioritário. Não sei onde o prefeito Carlos Eduardo resolveu cortar, mas estou vendo que ele puxou o cobertor para uma área extremamente sensível, talvez a única em que o cidadão efetivamente não pode esperar. Em Medicina, segundos podem separar a vida da morte. Reconheço e parabenizo a coragem e a seriedade do prefeito de Natal.
No entanto, preciso deixar registrado que o mérito maior por esse feito compete a uma brilhante equipe de Servidores Públicos, que fazem gestão de Saúde com uma tenacidade, um compromisso, uma abnegação, um republicanismo e uma paixão que são exemplares, e, em se tratando do Brasil, quase inacreditáveis. Dou esse testemunho porque tive o privilégio de conviver e trabalhar com essas pessoas por alguns meses, quando eles estavam à frente da Secretaria de Saúde do governo do estado. Infelizmente, a realidade da saúde pública estadual era tão problemática e complexa, que o trabalho verdadeiramente saneador, e hercúleo, não se tornou visível para a Opinião Pública. O enfentamento do nefasto corporativismo dos médicos, a reorganização dos serviços, que antes funcionavam como a casa da mãe joana e sem qualquer racionalidade, a ginástica financeira e política feita cotidianamente para honrar os compromissos mais básicos da Secretaria e evitar a suspensão do atendimento aos usuários passaram quase batidos aos olhos da população, que a despeito de todo o empenho da equipe que geria a Secretaria, continuava a sofrer com a desassistência nos hospitais estaduais, amplamente insuficientes para fazer frente a demandas que lhes competiam, mas também às que correspondiam aos municípios e União.
Até a semana passada, Natal era das raras capitais do país a não terem um hospital municipal, e simplesmente despejava seus pacientes nas portas dos hospitais estaduais, cruzando os braços diante do sofrimento inaceitável de tantos de seus munícipes. Quando estavam à frente da secretaria estadual de saúde, Luiz Roberto Fonseca e sua equipe brigavam com o município de Natal, procurando chamá-lo às suas responsabilidades. O município se acomodava na desculpa clássica da falta de recursos. Era mais cômodo superlotar o sofrido Walfredo Gurgel. É muito importante que se compreenda que sempre que um município não faz sua parte no desenho do SUS, o preço é pago pelos usuários, principalmente aqueles carentes da atenção à saúde mais especializada, que têm de disputar leitos, médicos e medicamentos com os pacientes que apresentam problemas de menor complexidade, num jogo de perde-perde para a população. Uma vez que assumiu a secretaria municipal de saúde, Luiz Roberto determinou-se a fazer aquilo que já devia ter sido feito há décadas, abrir um hospital para atender às demandas de responsabilidade do município de Natal. Nada mais coerente. E, no entanto, nada mais desafiador, nem mais corajoso. O processo passou, inclusive, pelo convencimento do prefeito e dos secretários das pastas administrativas quanto à sustentabilidade da proposta, nesse já tantas vezes mencionado cenário econômico-financeiro extremamente adverso.
Esse hospital vai resolver os problemas da Saúde Pública em Natal? Claro que não. Longe disso. Se em São Paulo, estado mais rico da Federação, os cortes na Saúde Pública já estão sendo diretamente sentidos pelos usuários do SUS, com a suspensão, por exemplo, de programas de entrega de medicamentos crônicos, imagine-se no nosso Nordeste. O recém inaugurado hospital de Natal é uma gota no imenso oceano de necessidades da Saúde Pública potiguar. Porém, é uma gota de valor inestimável. Não apenas porque efetivamente salvará vidas, desafogará um pouco os corredores dos grandes hospitais estaduais e minorará as dores de quem antes ficava inteiramente entregue ao desamparo. É inestimável pelo que representa como ato e exemplo de gestão pública da Saúde. A inauguração desse hospital representa a vitória da Sim sobre o Não, da Tenacidade sobre a burocracia, do Compromisso sobre a leniência, da Prioridade sobre a Demagogia, da Solidariedade sobre o comodismo, da Paixão sobre o automatismo, do espírito de Serviço sobre o egoísmo (tão humano).

Na época em que eu convivi com a equipe que hoje está no comando da Secretaria de Saúde de Natal, a dedicação desses servidores ao Interesse Público não despertava apenas a minha admiração, ela me comovia. Com eles aprendi o significado pleno e radical da expressão Servidor Público. Fui testemunha do alto nível de sacrifício pessoal a que se submetiam no esforço para melhorar a atenção à saúde da população. É uma bela equipe, cada um mais valoroso que o outro, e no comando de todos eles, um verdadeiro líder, um gestor público como até hoje não conheci igual. Não o vi titubear sequer por um segundo na defesa do interesse coletivo, mesmo quando isso significava cortar fundo na própria carne. Foi um Leão no enfrentamento do corporativismo dos seus pares, pagando o preço altíssimo da animosidade entre os seus. Como pude constatar de perto, o secretário Luiz Roberto só esmorecia quando se sentia impotente diante do sofrimento dos menores dos seus irmãos, dependentes de um Sistema de Saúde profundamente combalido, por décadas de má gestão, de omissão e de promiscuidade, em todos os níveis e por diveros atores, e pelo caixa de um estado quebrado. Sabe quando dá gosto ver a Administração Pública funcionando? E funcionando pelo e para o cidadão? Não?! Infelizmente, no nosso Brasil, é raro mesmo. Pois asseguro que o novo hospital de Natal é resultado disso. Meu sonho, preciso confessar, é ver Luiz Roberto e equipe no Ministério da Saúde. Não que ele seja o Superhomem e fosse resolver todos os graves problemas do SUS, mas tenho certeza de que com a enorme capacidade de trabalho de sua equipe, e com a liderança inspiradora, firme e republicana que ele exerce, os milhões de brasileiros que dependem da Saúde Pública estariam melhor amparados. Parabéns, Luiz Roberto! Parabéns Saudade, Marcelo, Teresinha, Manoella, Larissa, Otávio, Catharina, Camila, Renata, Juliana..... E parabéns ao prefeito Carlos Eduardo, que deu abrigo e cabimento a esse valente Exército de Brancaleão.