terça-feira, 16 de outubro de 2018

Como eu queria acreditar...




AVISO: O MINISTÉRIO DA TOLERÂNCIA ADVERTE QUE O TEXTO ABAIXO NÃO É RECOMENDÁVEL PARA QUEM TEM POSIÇÕES RADICAIS, À DIREITA OU À ESQUERDA DO ESPECTRO POLÍTICO.


Somos todos seres limitados. Temos nossas imperfeições e carências (Graças a Deus!). Não penso ser melhor nem pior do que ninguém. Ciente de minhas limitações, faço um esforço cotidiano para ser a melhor pessoa possível, nas minhas circunstâncias. Ao menos tento exercitar a generosidade, a solidariedade, o respeito profundo e sincero ao outro na sua integralidade. Acredito na Democracia e tenho sede de Justiça. Por isso mesmo, durante quase vinte anos da minha vida, militei por um projeto de esquerda para o país... nos meus tempos de movimento estudantil, por pouco não me filei ao PT....

Acho que o que quero escrever aqui é um desabafo. Das minhas angústias e tristezas com esse segundo turno tão polarizado. O primeiro desabafo é o da minha indignação com as forças de centro desse país, que foram incapazes de se unir em torno de uma candidatura eleitoralmente viável. A vaidade, o autismo, o orgulho e a falta de compromisso efetivo com a coletividade – por parte de lideranças políticas importantes -- nos precipitaram nessa beira de abismo. Não sei se um dia conseguirei perdoá-los.

O segundo desabafo é a revelação de um desejo: como eu queria acreditar!!!

Proclamo com toda a honestidade do meu coração: queria, neste momento, a bênção da ignorância, ou a da credulidade dos ingênuos e idealistas, ou até a das certezas dos desesperados! (só não quero, jamais, o cinismo dos salafrários)

Como eu queria acreditar que o PT tem um projeto de país e não um projeto de poder!

Como eu queria acreditar que o PT de fato representa A alternativa democrática! Como eu queria ignorar o caderno de teses do PT, publicado ainda no ano passado, cheio de afirmações e compromissos em claro confronto com os princípios e fundamentos da Democracia. Como eu queria não ter lido o programa de governo do presidenciável Fernando Haddad, que fala em “controle social” não só da Imprensa, mas da Justiça.

Como eu queria acreditar que o PT defenderá os valores democráticos a qualquer custo! Como eu queria me libertar do receio de que uma vez de volta ao Poder, o PT empregue todos os meios legítimos e ilegítimos para não mais largá-lo! Como eu queria esquecer das lições de Sun Tzu sobre o instinto de sobrevivência e a sanha vingadora de uma fera ferida, para então poder acreditar no argumento de que o PT não seguiria a trilha da autocracia porque “nunca fez isso antes” (seria maravilhoso, inclusive, não ter tomado conhecimento da entrevista de José Dirceu a El País).

Queria tanto conseguir relativizar o peso do apoio dos governos petistas e de seus militantes e aliados a várias ditaduras de esquerda, que juntas sacrificaram e continuam sacrificando milhões de vidas pelo planeta. Queria esquecer o desastre humanitário da Venezuela e o apoio vergonhoso de Lula a Hugo Chávez e Nicolás Maduro. Queria ignorar que os governos do PT investiram mais de 50 bilhões de reais – dos contribuintes brasileiros -- em países governados por ditadores-na-prática, simplesmente porque eram regimes “amigos”, alinhados ideologicamente à esquerda, sem qualquer preocupação com direitos humanos violados ou desrespeito aos valores democráticos.

Como eu queria acreditar que um governo Haddad teria compromisso com a porta estreita do equilíbrio fiscal; acreditar que contrariando as promessas feitas em sua própria propaganda eleitoral, de retomar, ampliando, os programas-ícones da era Lula, para fazer o Brasil feliz de novo, o governo Haddad abraçaria o remédio amargo da austeridade, evitando que seguíssemos para a ruína econômica.

Como eu queria acreditar que uma consagração nas urnas não teria o efeito simbólico de chancelar o maior escândalo de corrupção protagonizado por um partido, na história das democracias contemporâneas. Como eu queria acreditar que não foi o PT que institucionalizou a corrupção e quase fez dela uma política de estado. Como eu queria esquecer que passei anos militando pelo PT justamente com a expectativa de que ele pusesse fim à corrupção existente até então – aquela que hoje parece até coisa de amador.

Como eu queria acreditar que Fernando Haddad, o intelectual preparado, o doutor em filosofia, o homem elegante e equilibrado, teria força e autonomia para governar segundo seus próprios valores e crenças pessoais, sem a interferência de Lula e José Dirceu!

(Como eu queria esquecer que Fernando Haddad foi ministro da educação por 7 anos, que o PT governou o país por 13 anos, e que ambos têm considerável parcela de responsabilidade sobre o maior crime que já se cometeu contra a memória deste país: o incêndio do Museu Nacional!)

Como eu queria acreditar que Lula não acabaria solto e a Lava-Jato não seria sabotada, para alegria de políticos de todas as colorações -- inclusive os de plumagem tucana, que mal começam a ser tornar a bola da vez.

Como eu queria acreditar que a violência das declarações de Bolsonaro e mesmo a abominável-inaceitável violência física e simbólica de seus seguidores é maior que a violência dos milhares de bilhões de reais desviados dos cofres públicos nos 13 anos de governo do PT. Como eu queria esquecer o contingenciamento de 131 bilhões de reais da saúde pública nos governos Lula e Dilma e poder acreditar que o PT não tem nada a ver com a mais grave crise enfrentada pelo SUS desde a sua criação. Como eu queria não enxergar a relação de causalidade entre a irresponsabilidade administrativa do PT e os milhares, quem sabe milhões de compatriotas, que independentemente de gênero, cor ou opção sexual morreram nos corredores e filas dos nossos hospitais públicos...

Como eu queria acreditar que o PT não tem nenhuma responsabilidade sobre os cerca de 60 mil brasileiros que morrem por ano com a explosão da violência, enquanto bilhões de reais da segurança pública também foram contingenciados nos governos petistas (inclusive a verba supostamente carimbada do Fundo Penitenciário Nacional)....

Como eu queria ter essa clareza de que o PT é muito melhor do que “ele”! Seria tão reconfortante, tão mais leve e tão mais fácil. Afinal, é bem melhor para a consciência de uma pessoa que procura, nas suas ações cotidianas, estar ao lado do Bem, acreditar que neste pleito está fazendo uma opção pelos mais nobres valores humanos, políticos e sociais. Daria até pra encher a boca e proclamar orgulhosa que com meu voto defendo a vida, a tolerância, a diversidade, as minorias....

Como eu queria ter essa certeza de que o PT é o único caminho que pode nos resguardar de um mal maior, que pode nos salvar como nação e coletividade.... ao menos eu não teria a alma tão dilacerada.

Ah, se eu conseguisse acreditar.... (suspiro profundo da alma)... poderia dormir tranquila, cheia de certezas, e feliz comigo mesma...

(tela: Cícero Dias)

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