sexta-feira, 22 de abril de 2016

Nunca mais!


2/4/16

Nesse momento de ânimos tão acirrados no país, é bom a gente ter cuidado pra manter cada pingo no seu "i". Uma coisa é a gente desejar e pressionar pelo término Legal e Legítimo de um governo enredado até o pescoço no desvio de bilhões de reais dos cofres públicos (pra não falar de outros absurdos). Outra bem diferente é apoiar qualquer tipo de referência à Ditadura. 

Pelo que eu saiba, não existe registro, na História da Humanidade, de ditadura, seja de Direita, seja de Esquerda, que não tenha cerceado a Liberdade de Expressão, suprimido o Direito de Defesa das pessoas, ou torturado opositores (às vezes meramente suspeitos).
Não há nenhum benefício para a ordem social e política que mereça abrirmos mão de valores como a Liberdade, a Vida e o respeito à Integridade Física e Moral dos cidadãos.
E para que não reste dúvida a esse respeito, reproduzo trecho de depoimento de Frei Tito, à própria Justiça Militar:

"Na quarta feira, fui acordado às 8 horas, subi para a sala de interrogatórios, onde a equipe do capitão Homero me esperava.
Repetiram as mesmas perguntas do dia anterior. A cada resposta negativa, ou recebia cuteladas na cabeça, nos braços e no peito.
Neste ritmo prosseguiram até o início da noite, quando me serviram a primeira refeição naquelas 48 horas. (…)
Na quinta- feira, três policiais acordaram-me à mesma hora do dia anterior. De estômago vazio, fui para a sala de interrogatórios. Um capitão, cercado por uma equipe, voltou às mesmas perguntas.
Vai ter que falar, senão, só sai morto daqui”, gritou. Logo depois vi que isto não era apenas uma ameaça: era quase uma certeza.
Sentaram-me na “cadeira de dragão” (com chapas metálicas e fios), descarregaram choques nas mãos e na orelha esquerda. A cada descarga, eu estremecia todo, como se o organismo fosse decompor.
Da sessão de choques, passaram-me ao pau-de-arara. Mais choques, pauladas no peito e nas pernas cada vez que elas se curvavam para aliviar a dor.
Uma hora depois, com o corpo todo sangrando e todo ferido, desmaiei. Fui desamarrado e reanimado. Conduziram-me à outra sala, dizendo que passariam a carga elétrica para 230 volts a fim de que eu falasse “antes de morrer”. Não chegaram a fazê-lo.
Voltaram às perguntas, batiam em minhas mãos com palmatórias. As mãos ficaram roxas e inchadas, a ponto de não ser possível fechá-las. Novas pauladas. Era impossível saber qual parte do corpo doía mais: tudo parecia massacrado.
Mesmo que quisesse, não poderia responder às perguntas: o raciocínio não se ordenava mais. Restava apenas o desejo de perder novamente os sentidos.''
(depoimento copiado do blog de Sakamoto)

Frei Tito se enforcou poucos anos depois, durante exílio na França. Seu depoimento é um dos muitos que foram registrados. Lembro-me de que, quando universitária, fui incapaz de concluir a leitura de "Brasil: nunca mais". Não consegui suportar o horror dos relatos dos torturados. Não vai aqui nenhuma ofensa a quem, hoje, faz nossas Forças Armadas. Cada pessoa só pode ser responsabilizada por seus próprios atos. 
Confesso, inclusive, que sempre fui muito reticente com relação a processos de "caça às bruxas". Mas quando vejo manifestações como a de Bolsonaro, celebrando um regime que torturou e matou tantos de nossos compatriotas, sinto-me tentada a concordar com o argumento de que fomos muito ligeiros e talvez levianos ao virar, sem muita reflexão, essa página triste e dolorosa de nosso passado como nação. 
Só posso esperar que sejam muito poucos os que porventura venham a ecoar e apoiar tamanha insensatez....

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