quarta-feira, 14 de março de 2012

Diário de viagem: Manaus, parte 2

Manaus, 27 de janeiro

Hoje Manaus amanheceu debaixo de chuva. Seu Sabá, nosso motorista, comentou que começou a temporada das águas. Neste momento não chove, porém o céu está totalmente encoberto. Cinzento e pesado.
Andei bastante de carro entre ontem e hoje. Manaus mudou muito mesmo, desde minha última passagem por aqui. Há grandes e novas avenidas, muitos prédios altos, de desenho moderno e arrojado, nos bairros mais novos. No entanto, à exceção de algumas manchas verdes, a cidade continua a dar-me a impressão de um deserto de tijolo e cimento, erguido em meio à selva (que não se avista de nenhum lugar). Tirando o centro histórico, Manaus é uma paisagem fria. Está mais organizada e limpa que há 12 anos. O que continua a causar-me estranheza é essa ausência, melhor dizer, escassez de verde.
Todo o charme da cidade está nos belos prédios, “resquícios de antiga civilização”, lembranças do passado faustoso da borracha. Nesse sentido, alegra-me muito a localização de nosso hotel. Estamos no coração de Manaus, a poucos passos do Teatro Amazonas. De minha janela avisto a bela cúpula, onde figura, tecida em brilhos, a bandeira nacional. De quando em quando, escuto o sino da igreja, vizinha ao teatro. No entorno do hotel, vários prédios charmosos. Espero ansiosa o tempo livre para passear por ali.
Ontem vi a belíssima caixa d’água, obra do século XIX, segundo me disseram. É um prédio impressionante. Um quadrilátero com a fachada em pedra rosada. Toda composta de enormes arcos, através dos quais se avista a estrutura, em ferro fundido. Adorei o nome: Reservatório do Mocó. Diverte-me a conjunção entre a elegância do prédio inglês e o debochado do nome.
Realmente, o melhor de tudo em Manaus são as pessoas. Afabilíssimas, acolhedoras. E simples. Tenho visitado Secretarias de Estado. É tudo tão informal, descontraído, hospitaleiro. Quando alguém lhe diz, se precisar de alguma coisa, me ligue! Pode-se sentir que é verdadeiro. Não se trata desse “me liga” retórico e vazio, mera fórmula de polidez e cordialidade superficial ao qual estamos acostumados, em outras partes do Brasil. Confirmo, assim, a impressão que tive anos atrás. As pessoas são o maior atrativo deste lugar, hoje, já não tão remoto assim. Manaus está se transformando em metrópole....
A praça do Teatro Amazonas, conhecida como Largo de São Sebastião, está um charme só! Fecharam uma das ruas laterais e a rua defronte ao teatro. Ambas viraram extensões do Largo. O casario antigo, provavelmente anterior ao teatro, foi restaurado. É a coisa mais graciosa e encantadora da praça. Nas casinhas, em estilo colonial, brasileiríssimo, funcionam bares, restaurantes, centros de artesanato, galerias. Há muita vida no Largo. Não só turistas eventuais, como nós, que ali fomos beber e saciar a fome, mas populares, passeando, comendo churros e tomando tacacá. A barraquinha de tacacá e a banca de revistas, onde comprei belos postais, são em estilo inglês, no verde típico e em ferro trabalhado. Ainda que sejam meras imitações do passado, conferem graça ao cenário. O elemento kitsch é a iluminação azul, ao pé das árvores. Meu Deus, por que a contemporaneidade consegue tirar a poesia de quase tudo? Que talento a humanidade tem desenvolvido, pra “acafonar” as coisas!

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