quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Cartas para Minha Irmã: a caminho de Santiago de Compostela 1


09/09/15

Niquinha,

Hoje começou, efetivamente, minha jornada para Santiago.
Ao contrário do dia chuvoso de ontem, hoje fez um sol radiante. Nenhuma nuvem no céu. Acordei cedo, e após um croissant fresquinho com chá, tomei o metrô até a Gare Montparnasse. Imprimi meu bilhete, mas não consegui identificar meu trem no painel, porque no bilhete não consta o destino final. Tive que ir ao centro de informações. Um rapaz gentilíssimo me orientou e pude subir no trem com tranquilidade. Um parêntese para dizer que estou impressionadíssima com a gentileza dos franceses. Em todo lugar que eu fui, o tratamento foi de uma gentileza só. Parece que depois de campanhas publicitárias em prol da simpatia com os turistas e de uma Copa do Mundo, os parisienses mudaram de postura. Bom. Viajei na primeira classe de um TGV! Chique, né? Mas foi só porque a diferença era de apenas cinco euros. Achei que valia a pena experimentar. As poltronas são um pouco mais amplas.
Viajei numa cabine com um casal parisiense super simpático e uma moça coreana que também vai fazer o Caminho de Santiago. O nome dela é Young. Eu fiquei super feliz com a Jesuscidência. Young (pronuncia-se Ian) também está viajando sozinha. Ela mora na Índia, trabalha numa ONG que ajuda refugiados tibetanos e veio só pra fazer o Caminho. Adivinha! Ela leu Paulo Coelho há uns dez anos e desde então sonhava em fazer o Caminho. Young tem a minha idade e é uma gracinha. Aquele jeitinho oriental tímido e doce, como a Dra. Norma. De certo modo, nos tornamos parceiras de viagem. Vamos iniciar a caminhada juntas, amanhã. O casal parisiense regula entre os setenta e os oitenta. Conversamos um pouco ao longo da viagem. Eles estão interessados nas Olimpíadas no Rio. Era tão bonitinho os dois juntos. Podia-se perceber a harmonia e o carinho entre eles. Me senti tão feliz ao contemplá-los. Tão amorosos um com o outro, depois de toda uma vida juntos...
Para começar o Caminho, toma-se um trem que vai de Montparnasse a Bayonne. Esta última é uma graça de cidade, com prédios antigos, uma linda ponte, uma igreja em estilo românico (do Espírito Santo). Também tem uma bela catedral, mas não deu tempo de visitar. Em Bayonne a gente já começa a ver uma concentração de peregrinos. Cada um com sua mochila e vários com os apoios pra caminhada. Muitos peregrinos de cabeça branca, o que me deixou bastante impressionada. Em Bayonne me convenci de que minha mochila estava muito pesada. Young também sentia a mesma coisa. Fomos, então, ao Correio. Despachei meu tênis e mais umas peças de roupa pra casa de Federica, na Itália. Fiquei com o essencial do essencial. O problema é que meu saco de dormir pesa muito. Talvez tenha de deixá-lo pelo meio do caminho. Veremos o que acontece.
De Bayonne tomamos outro trem (duas horas depois) para Cambo-Les-Bains, já nos Pirineus. E de lá, um ônibus, até Saint Jean Pied de Port. O trajeto entre Cambo e Saint Jean é belíssimo. Engraçado que eu tinha na cabeça a ideia de que os Pirineus eram rochosos, não sei por que... na realidade são grandes colinas verdes, entrecortadas por rios de leitos rochosos. A coisa mais linda. A imagem das árvores refletida na água verde, mas cristalina. Pontes charmosas. É em pleno coração do País Basco. As placas de sinalização das estradas são bilingues. E a língua basca é muuuuito diferente das nossas línguas latinas. Curiosíssimo. No ônibus, cheio de peregrinos, se podia sentir uma energia boa, alegre e ao mesmo tempo calma. Todo mundo fala com todo mundo. Trocam-se informações. Conhecemos uma senhora belga que está fazendo o Caminho pela sexta vez!
Chegamos a Saint Jean depois das sete da noite, mas ainda com dia claro. Saint Jean é uma gracinha de cidade medieval! Com muralha e tudo. Hoje não deu tempo de andar pela cidade, mas amanhã, com certeza irei fazê-lo, antes de partir. Eu e Young conseguimos hospedagem num albergue simpático. Jantamos num restaurante charmoso, com pátio nos fundos. Comida caseira, simples e gostosa. Estou bastante cansada, porém, feliz. Me sinto profundamente agradecida por estar aqui. Já estou com meu Passaporte do Peregrino em mãos, com meu primeiro carimbo! Sei que o Caminho não será fácil, e os primeiros dias são justo os mais difíceis. Mas também tenho a certeza de fé de que vai dar tudo certo. Como estava estampado na camisa de um senhor alemão: No pain, no glory.
Te amo, Minha Irmã. Fica com Deus!
Beijo saudoso,


Léia 

Nenhum comentário:

Postar um comentário