20/4/15
Depois
de dois dias cansativos, finalmente uma boa e reparadora noite de sono. Quando
acordo, D. e L. já não estão em casa. Afinal, resolvo limpar um pouco meu
quarto e o banheiro. Passo a manhã nessa pequena faxina. Nada que faça
diferença na casa, mas me sinto melhor de ter os ambientes onde circulo mais
limpos e organizados.
D.
mantém a casa fechada o tempo todo, por causa do ar condicionado. E isso me dá
certa aflição. Ainda mais com o gato dentro de casa. Feliz ou infelizmente,
desde que cheguei tenho o nariz meio entupido. Primeiro por causa da gripe que
me pegou em Miami, agora já suspeito que estou tendo alguma reação alérgica.
Todas as tardes meu nariz começa a fechar e estou usando uma medicação nasal
para poder dormir. Não sei se é a sujeira da casa, ou a Primavera. Lembro que
em meus últimos anos em Berkeley, tive rinite alérgica exatamente nos meses de abril
e maio, quando as plantas começam a renascer e espalhar mais pólen pelo ar.
À
tarde, L. se oferece para passear comigo pelo centro de Baton Rouge. L. é muito
retraído, e pouco interage com D., mesmo antes do episódio do tiro na janela.
No entanto, ele tem sido muito gentil comigo. Caminhamos à beira do rio
Mississipi. É um rio largo, caudaloso e feio, pelo menos tal como o vejo nessa
primeira vez. É um rio de águas barrentas e tristes. Não sei explicar porque me
parece triste. D. me explica, mais tarde, que é um rio traiçoeiro, não parece,
mas é perigoso, por causa da velocidade das águas. Nem pequenos barcos navegam
nele. Tomar banho, então, nem pensar (mesmo que não fosse muito poluído). À
beira do Mississipi, em Baton Rouge, há uma orla, com bancos, luminárias,
esculturas e uma calçada onde se pode passear, caminhar, correr. Um muro de
contenção, desce do passeio até a beira do rio, em posição diagonal. Trata-se
de uma estrutura de contenção das águas, para as ocasiões em que o rio enche.
Eu e L. nos sentamos bem à beira d´água e ficamos olhando as águas escuras,
revoltas e tristes. Um grande barco à vapor repousa na ponta de um píer
emoldurado por um portal modernoso, cheio de arcos. É um cruzeiro que vai até
Menphis. A viagem de sete dias custa sete mil dólares. Me pergunto quem paga
essa fortuna para subir o Mississipi. Imagino que seja pela nostalgia e pelo
valor histórico do barco, que parece uma versão original daqueles que vemos nos
filmes.
Um
pouco depois do barco, à esquerda de onde estamos, se situa um outro barco, que
é, na verdade, um cassino. À direita, bem mais longe de onde estamos, um outro
barco abriga outro cassino. L. me explica que o jogo é permitido em Lousiana,
desde que seja dentro d´água. Essa legislação parece fazer pouco ou nenhum
sentido.
Deixamos
as margens do Mississipi e vamos visitar o campus da LSU, a universidade do
estado da Lousiana. O campus é lindo, como a maior parte dos campi americanos,
diga-se de passagem. Prédios em tijolo aparente, de argila clara, todos próximos
uns dos outros, muitas árvores imponentes, belos gramados, esquilos e pássaros
em abundância. Um carvalho enorme e majestoso estende seus galhos sobre uma
vasta área, tocando o chão em alguns pontos. Estudantes caminham em todas as
direções, mas apesar do movimento constante de pessoas, reina um silêncio
surpreendente e reconfortante no campus. Sobre a porta de entrada do prédio de
Astronomia noto um alto-relevo com símbolos do zodíaco. Um grande galpão abriga
a escola de artes plásticas, onde alguns alunos trabalham em suas obras, como
se estivessem em seus pequenos ateliês. O pátio central da Universidade abriga
uma coleção de esculturas contemporâneas. A torre com o relógio me lembra
Berkeley. Um enorme estádio de football me sugere que o time da LSU pode ser
uma paixão local. As cores da LSU são fortes e estão por todo o campus: roxo e
amarelo.
Da
LSU seguimos para o Museu de Artes e Ciências de Baton Rouge, para assistir a
uma palestra de uma professora da American University of Cairo sobre múmias de
animais. Antes da palestra vistamos a coleção que o Museu possui do Egito. São
poucas peças, porém eles têm uma preciosidade: uma múmia de mais de dois mil
anos. A exposição é interessante, apesar de pequena. Um pequeno cocktail nos surpreende à entrada da
palestra. Há um queijo de cabra divino. A professora, de traços indianos e belo
sotaque britânico, é muito simpática e divertida. A palestra é bem
introdutória, desenhada para um público leigo como eu. Aprendo várias coisas
sobre costumes do Egito Antigo, além dos princípios da mumificação, que
consiste basicamente num processo de desidratação por meio de sal e
bicarbonato, se entendi bem.
Chegamos
em casa e D. nos espera com várias caixas de morango, que precisam ser limpos e
selecionados para congelamento. Ela fará tortas e geléia para vender. Mais uma
de suas estratégias de financiamento do projeto com as comunidades carentes da
América Central. A casa rescende a morango e vou me deitar tarde, impregnada
desse perfume.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirÉ admirável como você descreve sua "Jornada ao Redor do Mundo" com uma imensa clareza. Sinto-me transportada para esses lugares à medida que eu leio seus textos.
ResponderExcluirEspero que você encontre o que procura: talvez paz interior, conhecimentos diversos, ser humanos idem. E quem sabe, nesse longo caminho, apareça um grande amor...