Por que uma pessoa decide largar todos os confortos e
seguranças de uma vida bem estabelecida, profissionalmente bem sucedida, perto
dos que ama, para se lançar numa aventura ao redor do mundo? Por que tirar um ano
“sabático” e andar por aí sem destino muito certo, trabalhando em troca de
acolhida?
Bem, é claro que as experiências são pessoais e
intransferíveis, e cada um viaja por suas próprias e diferentes razões.
Conhecer lugares, encontrar pessoas, entrar em contato com outras culturas,
experimentar cheiros e sabores novos, fugir da rotina, descansar, relaxar.
Todas essas são boas razões para viajar. Neste meu caso específico, viajar pode
ser definido por uma frase que li num artigo de Paulo Coelho (logo ele),
compartilhado comigo por um amigo queridíssimo: “Viajar é a experiência de deixar de ser quem você se esforça para ser,
e se transformar naquilo que você é.”
A viagem que começo a fazer ao redor do mundo, portanto, não
é diletantismo, não é extravagância, impulso, loucura, ou vocação para o ócio, tampouco
se trata da mera realização de um sonho, mas resulta de uma necessidade
profunda e crescente de fazer uma pausa para crescer. Resulta da urgência em
repensar meu modo de vida, meus comportamentos, e encontrar um caminho para
vivenciar, na prática, no cotidiano,
aquelas que elegi como minhas prioridades, e que têm a ver com as pessoas que
amo e com o mundo em que desejo viver. A verdade é que desde que comecei minha
vida produtiva, em poucas fases fui capaz de priorizar, efetivamente, meus
afetos e meus valores. Deixo-me frequentemente levar por urgências que não são
minhas, deixo-me guiar por um perfeccionismo que me rouba o tempo das delicadezas,
das delícias, e até do sono, que me torna prisioneira de ansiedades e de
angústias sem real importância.
Como resultado desse frenesi em que voluntariamente tenho
vivido, fui me distanciando de mim mesma. Quantas vezes tenho me surpreendido
com a minha intolerância, impaciência, radicalismo, com minha incapacidade de
ouvir os outros, antes de emitir juízos definitivos e peremptórios sobre os
fatos e as pessoas. Pois foi essa sensação crescente de estranhamento de mim
mesma o que me jogou nessa aventura de aprendizagem e redescoberta, que acabo
de começar.
Não pretendo chegar a lugar nenhum, apenas
desejo aprender -- ou seria mais correto dizer “reaprender” -- a viver com a
simplicidade, a alegria e autenticidade da criança que eu fui. Trata-se, portanto,
mais de uma travessia, que de uma viagem. Ao longo desse percurso, cujo traçado
ainda desconheço, espero aguçar minha consciência e descobrir em mim as
ferramentas para vivenciar a coerência que tanto almejo.
Que lindo texto! Bjs e bom caminho
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