terça-feira, 28 de abril de 2015

O Bom Pastor


Domingo passado fui à missa na Igreja Episcopal, com D. A denominação é Anglicana e o rito da missa é praticamente idêntico ao da Igreja Católica. Uma diferença importante: eles convidam todos os batizados em Cristo a receber a Comunhão. Num dos panfletos da Igreja, eu li que isso não significa que eles não levem em conta a importância da Comunhão, mas sim, que eles dão extrema relevância ao Batismo. Perspectiva muito interessante. Também me parece muito bom que eles não imponham o celibato aos sacerdotes. Tomara que Francisco consiga levar nossa Igreja a esse ponto de equilíbrio e bom senso.
A missa foi linda. Teve coro e um organista que abriu e fechou a celebração com peças clássicas. D. passou a cerimônia inteira gentilmente selecionando as páginas das leituras e dos cantos, nos dois enormes livros posicionados em frente a cada fiel. Estava preocupada que eu pudesse acompanhar tudo. Uma gracinha.
A Igreja de St. James (São Tiago) é um belo prédio do século XIX, em tijolo aparente por fora. Um edifício sóbrio e elegante, com uma comprida torre e a fachada principal pontiaguda. Dentro, destaca-se a madeira trabalhada, em estilo gótico, com dois vitrais grandes nas laterais da nave principal, retratando cenas da vida de Cristo. A única imagem de santo é a de Saint James, acima do altar, retratado num conjunto de “vitrais” da Tyffany, do início do século XX (1910 mais ou menos). Todo o conjunto sugere uma atmosfera de sobriedade, quebrada basicamente pelo colorido dos forros dos bancos no altar, preciosamente bordados, e pelo carpete fuccia, que forra toda a igreja. A nave central, na realidade, é pequena. E a missa teve uma reduzida audiência. Vi apenas quatro pessoas negras, dentre as quais o organista e duas mulheres que cantavam no coro. Antes e após a missa, os fieis e sacerdotes se reúnem no ampla e igualmente elegante salão paroquial, aos fundos da Igreja. Servem-se cookies, café e limonada.
O que mais gostei foi o sermão do Padre. Um senhor gorducho, de cavanhaque branco e gestos tranquilos, porém firmes. Seu tom de voz era igualmente calmo, baixo, porém, seguro. O tom da voz que exorta, orienta, com serenidade e sem pretensão. Conheci outros padres americanos que falavam de modo semelhante. Talvez seja um traço cultural. Não há estridência. Não há exagero. Me transmitem uma sensação de equilíbrio que parece tão adequada ao seu papel de líderes espirituais... No Brasil, lembro-me de dois sacerdotes que falavam com essa serenidade, firme e humilde: Padre Luiz Antônio, que foi pároco em Boa Viagem, e Frei Aloísio, da Ordem Terceira de São Francisco. Não o conheci pessoalmente, mas acho que D. Helder também falava assim. Acho que quero dizer que nessas pessoas a autoridade moral, a liderança espiritual, prescinde da voz elevada ou estridente, ou de qualquer gestual mais dramatizado...
O padre de St. James proferiu um belo sermão sobre O Bom Pastor. Duas ideias me chamaram a atenção. A primeira foi sobre a sensação de conforto que uma voz conhecida sempre provoca em nós, criaturas humanas. Somos capazes de reconhecer as vozes dos que amamos à primeira palavra. E como esse reconhecimento pode nos encher de alegria! É um fato. O desafio é o de também estarmos aptos a reconhecer a voz de Deus, quando Ele fala conosco.

A segunda ideia é ainda mais interessante e diz respeito à imagem do Bom Pastor. Quem é, afinal de contas, o Bom Pastor? Em seu sermão, o Padre nos convidou a pensarmos no Bom Pastor não apenas como aquela figura que ampara, e que é capaz de dar a vida por suas ovelhas, mas como alguém que também está ali para exortar, quem tem um cajado na mão e um saquinho de pedras, para cutucar e admoestar as ovelhas que querem seguir pelo caminho indevido. O Bom Pastor é aquele que sabe ser firme e rigoroso quando é disso que suas ovelhas precisam. E aí, seguindo outro traço que talvez também tenha a ver com uma tradição cultural americana – e que muito me agrada --, o padre conectou essa mensagem com o cotidiano de seus fiéis. Nos exortou a pensarmos nos bons pastores que cruzaram nosso caminho, de quem nem sempre soubemos reconhecer as lições importantes. Nos estimulou a sermos bons pastores na vida de outras pessoas. Cumprindo, dentre outras, a espinhosa missão de advertir, cutucar e alertar.

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